quinta-feira, 13 de abril de 2017

O fim do mundo


No encontro de um rochedense com uma vacariana, ocorre surpreendente diálogo metafísico.

— O mundo vai acabar!

— Vai demorar muito?
 Ah vai. Vai ser daqui um “googolplex” de anos.
Eu explico. Em 1916, Einstein formulou a teoria relativa às ondas gravitacionais, que resultam da colisão de buracos negros.
Um buraco negro é um espaço vazio; de cor negra, isto, é com total ausência de luz; pesado como estrelas e pequeno como cidades. Quando dois buracos negros colidem, ocorre um evento extremamente poderoso, com enorme produção de energia — algo que tem similaridade com o “big bang”, que deu origem ao universo, há mais de 13 bilhões de anos.
Conforme Janna Levin, interpretando a proposição de Einstein, “essa profusão de energia emana de buracos que se coalescem numa forma puramente gravitacional, como ondas na forma de espaço-tempo, como ondas gravitacionais.”

— Elas são parecidas com as ondas do mar?
 Não. A única semelhança é que ambas fazem algum ruído. No final da década de 1960, os gênios Rai Weiss, Kip Thorne, Ron Drever e outros cientistas — com os respectivos meios do Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT) e do Instituto de Tecnologia da California (CALTECH), nos Estados Unidos — iniciaram o processo de obtenção de máquinas que fossem capazes de “ouvir” as ondas gravitacionais. Eles queriam comprovar o que Einstein formulara no início do século. E assim, surgiram os pioneiros Observatórios de Ondas Gravitacionais por Interferometria a Laser (LIGO - Laser Interferometer Gravitacional Observatory) — o LIGO Hanford Observatory (LHO), no estado de Washington, sede do Hanford Site, localização dos primeiros reatores nucleares do mundo, que produziam plutônio para a bomba atômica que foi lançada em Nagazaki, em 1945; e o LIGO Livingston Observatory (LLO).
Em cerca de cinquenta anos, os pioneiros Weiss, Thorne e Drever motivaram cerca de 1000 cientistas e engenheiros de vários países do mundo para trabalhar no empreendimento. E assim, surgiram laboratórios menos poderosos: VIRGO, uma colaboração italiana e francesa; GEO, na Alemanha; TAMA e KAGRA, no Japão; e o LIGO-IN, na Índia.

— Não tem algum no Brasil?
 Não, aqui só tem Operação Lava Jato.

— Que tal se a gente produzir um buraco negro para jogar os corruptos da Lava Jato?
 Não, não podemos fazer isso. Tinha que ser tão grande que iria sugar muita gente inocente; e além disso, o pessoal politicamente correto iria reclamar da denominação buraco negro.
Mas preste a atenção. Durante mais de quatro décadas, com pertinácia, suor e genialidade, os cientistas conseguiram um extraordinário progresso. Então, em 2015 — com divulgação em 2016, no centenário da formulação da teoria de Einstein —, os interferômetros LIGO de Hanford e de Livingston conseguiram gravar as ondas gravitacionais da fusão de dois buracos negros de aproximadamente trinta massas solares e que foi considerado o mais poderoso evento já detectado desde o “big bang”. A energia das invisíveis ondas gravitacionais equivalem a 100 bilhões de trilhões de vezes a luminosidade do Sol. A gravação da música do universo tem sido considerada uma das maiores descobertas científicas dos últimos cem anos.

— Sim, mas que história é essa do fim do mundo?
 Com certeza, vai acontecer. Daqui a um “googolplex” de anos, o mundo vai se transformar em um único buraco negro.

— E quanto tempo é um “googolplex”?
 É um número que equivale a dez elevado a um “googol”, que por sua vez equivale a 10 elevado a 100. Então, um “googolplex” é um número com mais de 102 algarismos.
Vale dizer, um “googolplex” de anos é um tempo muito maior do que vários trilhões de trilhões de trilhões de trilhão de anos.

— Sabe de uma coisa: estou começando a ficar preocupada.

— Por que?

— E o que a gente vai fazer com os pen drives, os DVDs, os livros e o conhecimento acumulado com tanto sacrifício ao longo da História?
— Sabe que eu não tinha pensado nisso...

— Você não acha que uma saída é começar tudo de novo — um novo “big bang”, uma nova evolução do mundo, até chegar o outro fim do mundo; e assim por diante?

 É possível, mas aí apareceriam dois problemas!

— Quais?
 O primeiro: esperar a evolução de 13 bilhões de anos, após o novo “big bang”. E o segundo: ter que aguentar uma nova Lava Jato. Além disso, o fim do mundo só ocorreria depois de um outro “googolplex” de anos.

— Realmente, você tem razão. Essa rotina seria muito entediante ...


______________________________

[*]  Janna Levin. A Música do Universo: ondas gravitacionais e a maior descoberta científica dos    
                                                                  últimos cem anos. Editora Companhia das Letras, 2016.

[**] Um "googolplex" é 10 elevado a 100.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.
                                                                                000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000
                                                                                           (um número com 103 algarismos).




# # # 

Nenhum comentário:

Postar um comentário